No artigo anterior eu comentei a respeito do porquê eu acredito que o Neuromarketing e a Economia Comportamental são o futuro do Trade Marketing e do Marketing de Varejo e prometi que iria escrever sobre todos os fundamentos do Trade Marketing sob esta perspectiva. Inicio pela precificação, um dos temas mais mal compreendidos e que mais tem oportunidades de melhoria no ambiente de varejo.
Uma coisa é certa: existe algo que todos nós não gostamos de fazer em nossas jornadas de compra, inclusive é justo dizer que odiamos. Pagar. Chega a doer como uma dor física! Mas o que podemos fazer para amenizar esta dor dos nossos clientes e o que isto pode significar para o seu negócio?
De acordo com a ciência pagar realmente dói como uma dor física e isto é literal. Estudos dos pesquisadores Brian Knutson e Roger Lowenstein descobriram que a dor do pagamento aparece no nosso cérebro. Os resultados do estudo sugerem que quando encontramos preços que consideramos muito caros a ínsula mostra uma ativação antes da decisão de compra. Esta parte do cérebro é associado com experiências emocionais negativas e dores físicas.
Outro estudo de pesquisadores daCarnegie Mellon, Stanford and MIT provou que os centros de dor do nosso cérebro são ativados quando os respondentes são expostos à preços, particularmente aqueles considerados muito altos.
O sentimento mental que temos ao pagar é chamado de a “dor de pagar” e foi utilizado a primeira vez pelos psicólogos do consumo Ofer Zellermayer e o seu colega George Loewenstein. O termo se refere à emoção negativa experimentada durante o processo de pagamento. Perdemos dinheiro quando pagamos por algo e temos aversão à perda, isto é algo da nossa natureza, da nossa espécie.
Ok, porém temos que cobrar dos nossos clientes então como podemos amenizar a dor de pagar?
- Promova o Pagar Antecipado
Todos nós aqui no Brasil já tivemos a experiência de ir em um rodízio onde você paga um valor fixo e pode comer o quanto aguentar. Compare esta experiência com restaurantes onde em cada prato você paga um valor adicional? Estes dias fui em um restaurante japonês que tinha uma esteira com pequenos pratos passando pela sua mesa e cada prato custava um valor a mais! Não preciso nem dizer a minha dor à cada prato e quando a conta chegou. Deveria ter optado pelo rodízio do mesmo restaurante, que acontecia no salão ao lado, mas obviamente que no rodízio não tinham os mesmos pratos da esteira. A estratégia pode ser feita tanto para um lado, como para o outro, vai da estratégia de cada negócio.
Outro exemplo muito interessante que vivenciei, desta vez no segmento do Turismo, foi quando fui à Cancun em 2011 com dois amigos. Pagamos a opção de “tudo incluso” do hotel e chegando lá tudo que consumíamos nos restaurantes e bares do hotel já estava pago. Dava a impressão no momento que era de graça porque não precisávamos nos preocupar mais com os preços de nada.
Isto inclusive é suportado pela ciência também. Estudos dos pesquisadores Loewenstein e Prelec provaram que o consumo que já foi pago é aproveitado como se fosse de graça e “a dor dos pagamentos feitos antes do consumo (não depois) é amenizada pelos pensamentos sobre os benefícios que os pagamentos irão financiar. ” Eles chamaram esse fenômeno de “contabilidade prospectiva”
2. Use de combos ou pacotes
Outra estratégia que é utilizada em muitos segmentos é vender os produtos em conjunto em combos promocionais, ou pacotes com desconto e não vender eles separados, isto é algo que comprovadamente aumenta o ticket médio.
Como no exemplo anterior o fato de pagar apenas uma vez por mais de um produto não promove a dor associada a ter que fazer pagamentos distintos, separados.
O pesquisador Vinnet Kumar, professor assistente de Harvard, e seus colaboradores fizeram um estudo no mercado de vídeo games entre 2001 e 2005 que provou a eficácia dos combos promocionais. Eles observaram que a Nintendo aumentava de forma substancial a venda dos seus consoles quando eles eram vendidos combinados com algum jogo mas somente com uma condição – quando existia a possibilidade de comprar cada item separado também. No segundo cenário onde apenas o combo era ofertado os resultados não era nem de perto parecidos. A conclusão que eles chegaram é dar esta flexibilidade para o cliente para que ele não se sinta também obrigado a comprar um jogo que talvez ele não queira.
Resultados similares pareceram em outro estudo dos pesquisadores John T. Gourville e Dilip Soman. As empresas podem fazer mais dinheiro vendendo em combos e os clientes vão ser “empurrados” (do termo sem tradução literal “nudged”) a gastar mais dinheiro de um jeito que dói menos.
3. O poder do “grátis”.
A palavra “gratis” é quase que mágica e as pessoas são quase que induzidas a comprar e sabemos que o poder dela está associado também à redução da dor e que isto ajuda os negócios a lucrar mais.
Imaginem o seguinte cenário:
– R$ 50 + R$ 10 de frete
– R$ 60 + Frete GRÁTIS
– GRÁTIS + R$ 60 de frete
De uma forma racional os 3 cenários são exatamente o mesmo e você vai gastar R$ 60 porém a forma como os seres humanos tomam decisão é comprovadamente não racional. O último cenário é o mais escolhido e o consagrado economista comportamental Dan Ariely mostra isto em um exemplo parecido no vídeo 2.8 The Price of FREE – YouTube
O poder da palavra grátis foi provado em um estudo da Universidade de Duke onde os pesquisadores submeteram os respondentes à dois chocolates, um Hersheys Kisses a $ 0,01 e um Lindt a $ 0,15 e em um segundo cenário com o primeiro grátis e o segundo a $ 0,14. Reparem que a diferença financeira permaneceu a mesma porém o resultado no primeiro cenário foi de que 73% dos entrevistados escolheram o Lindt e 27% o Hershey’s Kisses e quando o Hershey’s foi ofertado de graça o resultado se inverteu e 69% dos entrevistados o escolheram enquanto 31% escolheram o Lindt.
O poder do grátis é muito utilizado em produtos digitais, onde você pode testar o produto antes de efetivamente comprar. Um exemplo foi o estudo feito pela plataforma de email marketing GetResponse – GetResponse Increased CTR By 159% | VWO Success Stories. Eles queriam testar se adicionar um botão de “experimentar grátis” na página principal do site iria influenciar a venda de contas pagas e o número de registros de contas grátis. Eles tinham um botão de “experimentar grátis” em outras páginas mas não na principal e eles tinham um receio de que se eles colocassem na página principal isto pudesse afetar seus resultados. Diante deste impasse eles fizeram um teste A/B apenas com o botão de comprar na página principal em uma versão e com os dois botões lado a lado na outra versão e o resultado foi que eles incrementaram em 159% o número de contas grátis e não tiveram nenhum impacto negativo no número de contas pagas.


4. Usar o efeito do dígito da esquerda
Esta já é uma tática amplamente utilizada, é só irmos à qualquer varejista, de qualquer segmento, e vamos ver diversos preços que terminam em “,99” e não em “,00” pois lemos, pelo menos aqui no Ocidente, da esquerda para a direita e de forma subconsciente atribuímos um preço inferior, mesmo que a diferença seja de apenas 1 centavo.
Isto pode ser explicado em outras aplicações também e um estudo publicado na American Economy Review que analisou mais de 22.000 transações atacadistas de carros usados mostrou que carros com odômetros entre 79.900 e 79.999 milhas eram vendidos em média por $ 210 a mais do que carros com odômetros entre 80.000 e 80.100 e apenas por $ 10 a menos do que carros com odômetros em 79.800 e 79.899.
O estudo dos pesquisadores Manoj Thomas e Vicki Morwitz chegou à conclusão que os preços terminados em 9 eram percebidos como menores do que preços acima em 1 centavo principalmente quando o primeiro número à esquerda era diferente (Ex: 2,99 e 3,00) e quando os preços comparados eram muito próximos, como por exemplo em uma situação que o preço do seu produto era comparado com um concorrente e os valores eram muito próximos. Tática esta do último ponto muito utilizada em supermercados em produtos de bens de consumo de alto giro.
Estes insights mostram que apesar da diferença numérica entre 5,00 e 3,99 e 5,01 e 4,00 serem a mesma os clientes não olham para os preços sob uma lente racional.
Um ponto que precisa ser ressaltado aqui é para termos cuidado com a percepção de mais barato, menos valor, produto em promoção que este tipo de precificação é associado pois dependendo do posicionamento da marca isto pode não ser interessante. Para produtos/serviços de maior valor e valores emocionais muito fortes faz mais sentido arredondar o preço. Quem pede um salário de R$ 4.999 e não de R$ 5.000? O mesmo vale para um produto, serviço que você entende ter mais valor e está disposto a pagar por isto.
5. Mostrar o produto e o preço juntos ou separados?
Em algumas situações os preços vão estar necessariamente colocados juntos mas mesmo nestas situações a ordem de atenção é crítica. Caso os clientes olhem para o preço antes a sua decisão vai estar mais ligada à uma negociação de valor ou preço e isto o torna mais sensível à preço. Na situação oposta a sua escolha vai ser mais afetada pelo seu desejo e motivação do produto em si e isto vai amenizar a dor do preço, de pagar. O aprendizado que podemos tirar é que quando podemos escolher sempre deixamos o preço para o final.
Estudos com ressonância magnética funcional (fMRI) mostraram que quando o preço é apresentado primeiro a pergunta de decisão sai de “ Eu gosto disto?” para “Isto vai ser realmente útil?” e provaram também que existe uma associação direta do preço e da experiência de prazer associada a um produto. O experimento sugeriu que aumentar o preço de um vinho aumentou a percepção do gosto e aumentou a utilidade experienciada pelo cérebro (Plassman et al., 2008).
O ponto é que nossas heurísticas e nossos vieses comportamentais afetam diretamente a nossa percepção de preço e valor e podemos utilizar disto a favor, elaborando estratégias de precificação que geram um melhor resultado.